Chegamos na Feira de São Cristóvão relativamente
cedo, em uma sexta-feira. Havia começado a chover um pouco antes, no ônibus,
ainda a caminho, mas isso não importava. Chegando lá, sujamos bastante nossos
pés no chão de terra da pista de dança em frente a um dos quatro palquinhos de
forró pé-de-serra. Minha sandália mais tarde arrebentou, e aquela foi a
primeira vez que dancei forró, mesmo. Nem sabia a diferença entre baião e xote,
e nem sabia como se dançava, mas meu primeiro par foi um senhor paraibano – acredito
que fosse, porque dançava “um pra lá e um pra cá” (um-um), e não dois pra lá e
dois pra cá. Sorridente e com um perfume muito bom (sutil), sua voz não ouvi –
não trocamos uma só palavra, nem antes nem depois, muito menos durante a
longa dança, que se estendeu por várias músicas. Nesse mesmo dia subi no
palquinho de Raminho e seu Trio Forró Pesado e cantei “Mata o papai”. E quais
outras? Não lembro. Talvez só essa, pois à época provavelmente este era o único
forró que eu sabia cantar do início ao fim (graças ao meu irmão mais velho, que
vez ou outra colocava um CD do Trio Forrozão, ao
vivo, para soar pela casa).
Comi baião de dois com aipim e bebi suco de
cupuaçu. Saí de lá pensando que a Feira era um pedaço do céu, pois a equação
era: comida barata e deliciosa + música perfeita + ambiente gostoso, acolhedor,
de todos (entrada a R$ 1,00, à época). Eu e o amigo Wilher – que hoje toca no
Trio Borogodó e já tocava zabumba na Feira – saímos de lá quase de manhã.
(Dançamos até funk em uma das barracas, mas o tópico funk fica para uma
próxima.)
Por causa desse dia, houve finais de semana em que
fui sexta, sábado e domingo a São Cristóvão. E depois de tanto dançar, curtir e
me envolver, comecei a cantar forró. Algumas vezes em Seropédica, com o Forró
de Cordas, que me deu essa alegria de pode fazer alguns shows muito gostosos
com eles, e também em outras situações e lugares: fazendo meus próprios shows
de forró, na Lapa; cantando com o Severino e Sua Gente em
diversas festas juninas, também, gostosas demais – pela companhia, pela
amizade, pela música. Cantar forró, percebi, me pareceu algo fácil, muito mais
fácil do que quaisquer outras canções que eu já tivesse cantado. Por quê? Não
sei! Mas cantei e canto forró com mais facilidade e descontração do que o faço
em outros estilos. Pode ser uma impressão só minha, mas o que importa é que
sinto isso.
A esta época me fascinei por diversas músicas e
artistas, ouvi atentamente Luiz Gonzaga, Elba Ramalho, Trio Forrozão, Marinês,
Trio Nordestino, Os 3 do Nordeste, Jorge de Altinho, Cassiano e Trio Beija-Flor
e tantos outros. E confesso que pirei um pouco com “Feira de
mangaio” cantada por Clara Nunes ao lado de Sivuca. Ficava ouvindo
no repeat, andando de bicicleta, não sei quantas vezes. Vício bom.
(Engraçado que quando comecei a escrever esse texto
um forró eletrônico estava tocando em algum lugar na vizinhança. O tal do forró
de teclado – depois que passei a frequentar a Feira, este passou a ser um som
que sempre me lembra de ótimas coisas, momentos de muito riso e dança. Deve ser
porque na Feira ouvi, por exemplo, uma inesquecível versão para “Umbrella”, de
Rihanna – “Se não valorizar”, em português).
A imersão nesse universo fez com que eu tivesse a
oportunidade de, em 2012, ir a Campina Grande com Jurandy da Feira, que me
convidou para participar do show dele na grande festa. Não sei se foi mais
emocionante cantar no evento ao lado de Jura ou conhecer a Paraíba: andar pelas
ruas embandeiradas, ver o pôr do sol ao som de outro Jurandy (o do Sax)...
E quanto às festas juninas, essas festas deliciosas?
Seja cantando ou apenas curtindo uma festinha de igreja, de pracinha, na casa
de alguém, observo que todos parecem se sentir um pouco mais infantis e
desarmados. Há um clima de espontaneidade muito bom no ar.
Eu agradeço ao povo brasileiro, norte e centro, sul
inteiro, onde reinou o baião. Foi e é delicioso incorporar mais este universo
ao meu. Que bom que expandi ainda mais minha visão e audição para além do
Sudeste, para além do que eu crescera ouvindo. Ouvindo baião e xote veio de
lambuja, também, todo o universo nordestino, com seu sotaque e sabor
inacreditáveis.